Xorxe: quando canalhice e burrice andam de mãos dadas

Allan Dos Santos
5 min readAug 26, 2020
Jorge Antônio de Oliveira Francisco é ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República

É muito difícil encontrar quem consiga raciocionar e julgar atos humanos de modo justo, ou seja, com aquele senso de responsabilidade que está implícito na compreensão da variedade da condição humana, longe dos clichês baseados em novelas ou manuais moralistas que tratam da complexidade humana como se fosse um mero conjunto de tijolos em um edifício social. Por isso essa tarefa é restrita a um círculo pequeno de homens em toda a história da humanidade.

Alguns casos, porém, não exigem um esforço intelectual extraordinário, como no do terrorista italiano Achille Lollo, militante petista, co-fundador do PSOL (Partido Socialismo e Liberdade), e autor de artigos de teoria marxista nas revistas trimestrais “Nação Brasil”, “Conjuntura Internacional” e “Crítica Social”, das quais era editor.

Uma denúncia de que Achille Lollo vivia no Rio de Janeiro foi feita pelo partido Alleanza Nazionale (“Aliança Nacional”), uma continuidade do antigo Movimento Sociale Italiano liderado por Gianfranco Fini. Achille Lollo apresentou-se na sede do Consulado Italiano do Rio de Janeiro para votar, uma vez que sua pena se encontrara prescrita. Declarou então, que no Brasil, como de conhecimento público, dedica-se há muitos anos ao jornalismo e à editoria. Preso durante alguns meses em 1993, por força de mandado internacional de captura da Interpol, foi solto por ordem do Supremo Tribunal Federal no ano de 2008. O terrorista alegou ter sido julgado e condenado por atos políticos, e que a Constituição Brasileira de 1988 determina que “não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião”.

Como Cesare Battisti, condenado pela justiça italiana pelo assassinato de quatro pessoas, sendo duas delas vítimas que reagiram a assaltos pelo bando de Battisti, Lollo foi recebido de braços abertos por políticos e militantes de esquerda no Brasil. Battisti, antes de ser extraditado da Bolívia, tinha como seu apoiador o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso, então advogado do terrorista.

Luís Roberto Barroso nunca havia colocado os pés em um presídio, mas passou a ir ao Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília, com regularidade. “Nas primeiras vezes, não sabia nem como me comportar. Visitava o Cesare pelo menos uma vez por mês. Às vezes, duas.” Para um advogado que vivia em um mundo mais de ideias do que de gente, foi um show de vida real.

Os crimes políticos ou de opinião de Achille Lollo

Na noite de 16 de abril de 1973, segundo os autos do processo em que foi condenado na Itália, Lollo, junto a outros três integrantes do grupo Potere Operaio (Paul Gaeta, Diana Perrone e Elisabetta Lecco), despejaram gasolina no apartamento onde vivia Mario Mattei, sua esposa e seis filhos. Quando acordaram com a casa em chamas a esposa salvou os filhos de 9 e 4 anos, duas filhas de 19 e 15 conseguiram sair sozinhas da casa, enquanto os outros dois de 10 e 22 anos acabaram carbonizados por não conseguirem sair do quarto.

Achille Lollo, mesmo depois de condenado teve direito de recorrer em liberdade, e vendo que sua defesa não seria frutífera, fugiu do país e se manteve escondido até que o crimes fossem considerados prescritos pela Corte de Apelo de Roma, vivendo no Brasil, sob proteção do STF e do governo petista.

Recentemente, o jornal Valor perguntou ao ministro Jorge Oliveira, muito próximo do presidente Bolsonaro, se “extremistas como Sara Giromini e Allan dos Santos são o PSOL de Bolsonaro”.

Ele respondeu:

“Em alguma medida, sim. Sem entrar no mérito do que cada um defendeu, há uma linha bem diferente que separa esquerda e direita, mas os dois têm seus extremos. E é natural que tenha. É bom que haja diferenças. Trazer esse rótulo de ‘paz e amor’ guarda alguma relação com o ‘cheguei ao poder legitimamente, vou governar para quem votou em mim, mas tenho que dialogar com quem não votou em mim’. Significa manter posições, mas ter um diálogo mais amplo com a sociedade. E talvez convencer quem não votou nele.” (grifos nossos)

Comparar dois indívíduos distintos e independentes com um partido político fundado por um terrorista e tendo um ex-candidato à presidência da república que fugia da justiça desde 2013 para evitar condenação por dano contra o patrimônio público é, na melhor das hipóteses possíveis, atestado de estupidez, canalhice e cafajestismo no mais alto grau.

Extremo, do latim extremus, é o que há de mais afastado, mais próximo do exterior, ou o último, situado na extremidade. Algo que é medido em extensão material e usado de modo análogo em comportamentos humanos. Quando opostos por contrariedade, mas nunca por contraditoriedade, manifestam oposição como bem e mal, noite e dia.

Como diz o escritor Sidney Silveira, “conhecemos comparando, e comparar não é outra coisa senão mensurar graus de similitudes entre coisas distintas”. E no direito, continua o escritor carioca, “a regra segundo a qual de duas ou mais coisas similares há de fazer-se o mesmo juízo, e não juízos diversos, é uma perfeita analogia”.

A analogia imprópria que parece ter sido feita pelo advogado Jorge Oliveira é também desproporcial. Mas uma analogia desproporcional e imprópria, coisa que qualquer adevogadinho de porta de cadeia, um advogado de meia tigela, tem a obrigação de saber, não pode ter sido a intenção de quem, além de advogado, é também Secretário-Geral da Presidência, não é? Seria como comparar o uso de arma de fogo de um policial e de um bandido como dentro do mesmo gênero de comportamento agressivo unificando a finalidade dos dois atos, distinguindo-os apenas pela eventualidade das circunstâncias ou do dress code.

Há algumas resoluções possíveis aqui:

Ele acha que eu já matei ou tenho desejo de matar pessoas ateando fogo nelas, especialmente crianças, mas tudo em nome do patriotismo, não do socialismo.

  1. Ele acha que eu já matei ou tenho desejo de matar pessoas ateando fogo nelas, especialmente crianças, mas tudo em nome do patriotismo, não do socialismo.
  2. Ele acha que depredei patrimônio público ou estou fugindo da justiça, em nome do patriotismo.
  3. Ele é incapaz de compreender a estupidez da pergunta do jornal Valor e responde sem saber distinguir os três elementos (PSOL, Sara e eu) utilizados no silogismo falacioso, o que o tornaria a pessoa mais incompetente para o cargo da Secretaria-Geral da Presidência da República do maior país da América Latina.

Dar o benefício da dúvida ao Secretário-Geral da Presidência da República (esse pessoal gosta de ser chamado pelo cargo que ocupa!) é um dever. Mas não será a mim que ele terá de responder, mas a um juiz, pois já pedi ao meu advogado (este tenho certeza que sabe o que é analogia desproporcional imprópria) que ingressasse com uma interpelação judicial para que Jorge Oliveira explique ao juiz o que ele queria dizer. Aguardarei e publicarei aqui para que todos saibam a resposta do Sr. Secretário-Geral da Presidência da República.

PS.: não quero sequer imaginar que Jorge Oliveira pensa ser eu um “Adélio Bispo” da direita. Não creio que ele seja tão vil.

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